27.10.10

Num estádio vazio

Esquece. Esquece os livros de papel e os beijos de mão dada. Esquece os filmes onde todos foram felizes para sempre, esquece a porta do cinema, esquece o escondidos nela, o abrigo à prova de água, esquece o barulho da chuva nas pedras, o encontro por acaso mas bom dos corpos, o motor dos carros, a borracha os travões, o disfarce e o abraço, o andamento da cidade. 
Esquece a engrenagem, os sinais e até a luzes. Esquece a frase, a linha, a estrofe inteira, esquece a letra do hino. Esquece o sentido dos ponteiros do relógio, a multidão a bater palmas, o som da bola a bater na rede, esquece-te de dizer é golo quando for, esquece-te de te levantar da cadeira de braços abertos, porque não sei se já te esqueceste mas já não te lembras do que é sentar os olhos no escuro e deixar o corpo a chorar como se não houvesse amanhã. Pode ser no vazio de um  estádio.